Você já quis jogar RPG no cenário da sua série, filme, livro ou jogo favorito? Para a maioria dos RPGistas, a resposta é um grande SIM. Afinal, quem não quer fazer parte de um grupo rebelde ajudando a destruir a Estrela da Morte? Se tornar o Avatar dominando os quatro elementos e derrubando o Senhor do Fogo? Ou investigar e caçar monstros perigosos como um witcher?
Interpretar personagens nos cenários de nossas obras favoritas pode nos dar um gostinho de como seria viver naquele mundo e acabar criando nossa própria versão da história. Mas por onde começar? Muitos RPGs são criados para um cenário e gênero específicos, o que torna difícil usá-los em outras propostas. Por outro lado, criar um jogo do zero para acomodar a nossa proposta pode exigir um tempo e esforço que às vezes não dispomos. A alternativa menos trabalhosa pode ser adaptar um RPG existente.
Já existe um RPG que faça o que eu quero?
Dependendo da proposta da obra que está tentando adaptar, você pode ter um pouco de trabalho. Existem muitos jogos oficiais de obras populares e, se der sorte, pode ter um para a que você quer adaptar também. Entretanto, algumas coisas como o idioma do jogo, disponibilidade ou preço podem ser barreiras. Nesse caso, ainda é interessante pesquisar jogos que se aproximem do cenário, gênero ou tom – no caso dos RPGs “genéricos” – do que você quer jogar. Isso vai garantir que você gaste mais tempo jogando e menos tempo ajustando regras e mecânicas.
Sobre o que é a obra? Sobre o que é o jogo?
Saber responder sobre o que é o seu jogo é essencial em um processo de game design (e adaptar um RPG também é game design). Portanto, é importante conseguir definir sobre o que é a obra que estamos tentando adaptar para entender com que tipo de mecânicas e regras precisaremos nos preocupar. Por exemplo, será que faz sentido se preocupar com uma lista detalhada de armas e poderes de combate em um jogo focado em mistério ou drama? Ou que seja tão fácil de se curar ferimentos na adaptação de uma obra em que vários personagens morrem por causa de infecções? Como lidar mecanicamente com cenários onde a magia é mais livre e versátil, diferente da tradicional “magia vanciana”?
É importante notar que filmes, séries e jogos contam histórias específicas dentro de um cenário, portanto você deve definir quais são as suas expectativas com a adaptação. Os personagens serão da mesma “categoria” que os personagens da obra original (como super-heróis, semi-deuses, alquimistas, etc)? Ou vão ser outros tipos de pessoas vivendo naquele mundo? A ideia é que o jogo siga uma estrutura e escala parecida com a obra original? Tudo isso lhe ajudará a decidir o que é importante ao analisar o jogo que você escolheu em busca do que faz ou não sentido para a adaptação.
Adapte a experiência, não as mecânicas
Dito isso, tem mais uma coisa que deve-se ter em mente ao modificar um jogo para acomodar o cenário de uma obra, principalmente no caso de jogos de videogame: adapte a experiência, não as mecânicas. É muito fácil nos perdermos tentando adaptar poderes, listas e aprimoramentos de armas, sistemas de criação ou outras mecânicas específicas que não vão contribuir para emular a experiência que queremos. Além disso, algumas mecânicas que funcionam em videogames não funcionam tão bem em um RPG. Lembre-se de revisar sobre o que é o jogo e cortar o que não for importante.
Regras que reforçam o gênero
Com um RPG com uma proposta próxima à obra que você quer adaptar e um entendimento claro sobre o que vai ser o jogo, você já tem o que precisa para começar a modificar o sistema. Abaixo eu discuto brevemente alguns subsistemas e mecânicas populares que ajudam a emular determinados gêneros.
Ferimentos
Nos populares RPGs de fantasia com foco em combate, os personagens são capazes de sobreviver a golpes, explosões e quedas severas, muitas vezes sem consequências. Em histórias em que os personagens são mais vulneráveis, como muitas vezes é o caso em cenários de terror ou baixa fantasia, isso pode ser um fator que atrapalha a experiência.
Pense em como os personagens da obra que você quer adaptar se ferem. Eles escapam de situações perigosas com facilidade? Os ferimentos são duradouros? É possível que eles morram em qualquer situação de violência ou, se isso acontece, só em momentos dramáticos? A maneira como a sua adaptação lida com isso pode definir se os jogadores serão motivados a enfrentar os desafios de forma mais arriscada ou violenta, ou a procurar alternativas mais sutis ou diplomáticas.
Facções
Histórias focadas em intriga e política normalmente têm vários grupos com motivações diversas. Essas facções têm agendas públicas ou secretas (muitas vezes ambas) e conseguem influenciar umas às outras em diferentes níveis. Em adaptações para RPG dessas obras, ter mecânicas transparentes que cubram os relacionamentos, crescimento e ações das facções mostra aos jogadores que eles podem influenciar o jogo político, não sendo algo definido unilateralmente pelo narrador.
Magia
Tradicionalmente, RPGs de fantasia medieval apresentam a “magia vanciana” – inspirada nos romances de Jack Vance. Isso significa que a magia deve ser executada a partir de listas pré-determinadas de feitiços e muitas vezes devem ser preparadas com antecedência pelo conjurador. Esse tipo de sistema de magia é replicado em diversos jogos, mas algumas obras apresentam uma magia mais livre e versátil. Nesse caso, a abordagem vanciana pode acabar atrapalhando. Pense em como abstrair o uso da magia e evite criar listas exaustivas de feitiços. Já que você não está criando um material para publicação, se concentre apenas no que o seu grupo vai precisar.
Sanidade
A descoberta de Coisas que a Humanidade Não Deveria Saber e a consequente descida em direção ao terror e à loucura é o tema de muitas histórias de horror. Medo é uma experiência naturalmente difícil de se criar durante uma sessão de RPG, então ter regras que definem como os personagens reagem e mudam diante do sobrenatural ou de situações traumáticas ajuda a reforçar a seriedade desses elementos na narrativa. RPGs de horror podem facilmente ser “pilhados” por essas mecânicas, só tome cuidado para não acabar com regras que reduzam muito a agência dos personagens.
Teste, mude e repita
Adaptar um RPG pode ser um processo trabalhoso e provavelmente o jogo não ficará como você quer na primeira tentativa. Mas não desanime! Narre algumas sessões curtas, anote o que funcionou ou não, faça as modificações que achar pertinente e teste de novo. Evite gastar energia com coisas que o seu grupo não vai usar e lembre sempre sobre o que é o jogo, caso as coisas comecem a ficar complicadas. Depois de algumas tentativas você certamente chegará ao conjunto de regras ideal para o seu grupo se aventurar no universo de sua obra favorita.
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Adaptar um RPG para jogar no cenário de nosso jogo, série ou filme favorito pode ser um processo trabalhoso, mas também é muito divertido! Você já criou alguma adaptação de RPG? Que dicas você tem para compartilhar? Comenta aí embaixo!