Categoria:Dicas de RPG

Balbúrdia Narrativa — Stream de RPG não é RPG de Mesa: A Síndrome de Matthew Mercer

Calma, o título é clickbait. Às vezes eu gosto de falar groselha em voz alta para chamar atenção e depois esmiuçar a ideia. Então, agora que você já está lendo este texto, devo dizer que não creio que o título seja uma completa mentira, apenas uma verdadezinha exagerada. RPG por stream é RPG de mesa, sim, mas também é algo a mais.

A perspectiva de uma stream de RPG de mesa

Critical Role é uma das maiores e mais antigas streams existentes de RPG de mesa. Com Matthew Mercer assumindo o manto de narrador, Critical Role já está em sua terceira campanha. E com tamanho alcance, certamente foi responsável por apresentar o hobby a incontáveis novos fanáticos e inspirar aventuras de RPG ao redor de todo o mundo. O que alguns chamam de “Síndrome de Matthew Mercer” é quando o mestre e/ou jogadores, inspirados por estas campanhas transmitidas com tanta qualidade, tentam transformar sua aventura rotineira em uma obra com o mesmo nível de produção.

Porém, quando colocamos lado a lado uma stream de RPG de mesa mestrada por Mercer e uma campanha cotidiana de seus inspirados seguidores, existem diferenças gigantescas. Começando pelo fato de que uma stream tem espectadores, e se ela não conseguir prender o seu público, ele vai embora. Não é à toa que Matthew Mercer e todos os jogadores de Critical Role, além de muito experientes no sistema jogado, também são dubladores. Interpretar personagens é o que fazem profissionalmente. Eles sabem como entregar um show.

Várias outras streams de RPG de mesa têm uma proposta parecida, não contando com um time de atores, mas com pessoas ao menos acostumadas a interagir frente às câmeras. Tudo isso ajuda a transformar uma mera campanha de RPG em um espetáculo de entretenimento quase cinematográfico.

Matthew Mercer alfineta a sua alma a cada segundo que você olha pro celular durante uma sessão.

A experiência dos que conduzem uma stream de RPG de mesa

RPG é uma narrativa coletiva. E como já dito, tanto Matthew Mercer quanto seus jogadores são dubladores. Isso significa que eles têm muita experiência narrativa. Mercer sabe conduzir uma história com maestria, e cada jogador tem ciência do tamanho do seu papel ali dentro. Ainda mais considerando que os jogadores se conhecem e jogam juntos há anos, a sinergia entre aquelas pessoas é natural para qualquer pessoa que assista.

Além disso, no Brasil também temos excelentes streams de RPG de mesa, como as do Mestre Pedrok, do Cellbit e as da própria Jambô. Todas inspirações monumentais para a comunidade. Porém, também devemos considerar que Mestre Pedrok é um grandessíssimo ator, inclusive foi professor de teatro por anos. Cellbit é um dos maiores streamers e youtubers do país atualmente, e sua habilidade com o público já se tornou orgânica. Leonel Caldela, narrador da recente Fim dos Tempos no canal da Jambô, é um romancista veterano e consagrado. Todos eles possuem um histórico pesado que deixa claro por que têm tais habilidades narrativas.

A equipe por trás da stream

Em streams de RPG de mesa de tamanhas proporções, costuma existir uma equipe por trás dos jogadores. A iluminação, a troca das câmeras, a trilha sonora (muitas vezes original) surgindo e sumindo na hora certa, as artes exclusivas dos personagens, criaturas e cenários. Tudo isso feito por um time preparado para somar ao entretenimento.

Arte original para a campanha Fim dos Tempos
Arte original para a campanha Fim dos Tempos

Essa necessidade de entreter transforma o RPG por stream em uma campanha diferenciada, normalmente acelerada. Os jogadores não se desviam da trama com facilidade, acontecimentos importantes surgem mais frequentemente, o narrador não precisa de um tempo para trocar de música e raramente vai parar o jogo para conferir regra no manual. Porém, o oposto provavelmente vai acontecer em sua mesa de RPG pelo discord, e está tudo bem. É assim mesmo.

Preparar uma campanha toma um tempo absurdo do mestre, mas uma stream de RPG de mesa pede por uma produção e cuidado ainda maior e completamente não-obrigatórios para uma singela reunião de amigos.

É claro que tornar uma mesa comum em uma campanha mais ativa e com elementos cinematográficos sempre pode torná-la mais interessante. Eu mesmo gosto de usar diferentes playlists para ambientações. Chamo a atenção de jogadores quando estão prestes a se desviar para um assunto paralelo para não quebrar a imersão e tento fisgá-los com acontecimentos marcantes quando menos esperam para trazer a tensão de volta à mesa. Mas tudo isso são coisas que vêm com a prática de jogar e narrar ao longo do tempo, portanto você não precisa se cobrar ou cobrar de seu mestre e jogadores.

Então por favor, não seja um babaca, pois seu mestre não é Matthew Mercer e você e seus companheiros de mesa não são um time de dubladores profissionais auxiliados por uma equipe técnica.

Ser ou não ser RPG de mesa?

Enfim, existe uma galera que defende que streams de RPG de mesa deixam de ser RPG de mesa pelos motivos que falei aí em cima. Muitos ainda dizem que Critical Role e outras campanhas de larga escala são roteirizadas, ou que os jogadores já têm pelo menos uma ideia do que vai acontecer para poderem se preparar para os eventos. Não vou entrar no debate de roteirizado x não roteirizado, pois o que se tem sobre isso praticamente são burburinhos de twitter e conversas de reddit.

Porém, discordo completamente sobre a parte de não ser um RPG de mesa, pois sua essência ainda está ali. Um grupo de personagens sendo guiado pelo mestre através de uma narrativa onde os jogadores tomam suas decisões e assumem os riscos e responsabilidades. Se por acaso os jogadores são entertainers e existe uma equipe exclusiva para auxiliar na produção, isso apenas torna a stream em um RPG de mesa com algo a mais. E esse algo a mais é apenas uma perspectiva um pouco diferente da de juntar cinco pessoas e se divertir sozinhos por algumas horas. É a proposta de fazer dezenas, centenas ou até milhares de pessoas se divertirem também.

Balbúrdia Narrativa — O RPG Além do Combate: Resolvendo conflitos de forma não violenta

RPG Além do Combate

Rolar a iniciativa é um dos prazeres mais banais para qualquer jogador de RPG, pois além de um momento aguardado, também é planejado. Habilidades e magias aprendidas ao longo dos níveis, pontos de atributo calculados, tudo enquanto pensava no bônus de dano lá na frente. Porém, existe um universo muito maior no RPG além do combate.

Batalhar parece uma coisa tão intrínseca do RPG que às vezes pode ficar difícil separar uma coisa da outra. É claro que cada campanha é uma campanha e cada sistema é um sistema. Mas mesmo em um sistema de RPG com outros focos além do combate, em todos eles na grande maioria deles as regras para a porradaria generalizada ainda estão presentes.

Uma vez me explicaram que um grupo de RPG é como uma estrela de cinco pontas. O tanque na ponta de cima, protegendo o grupo enquanto recebe e aguenta dano. Ladinos, caçadores, magos e etc. nas pontas laterais, logo atrás do tanque, dando a maior quantidade de dano que conseguirem. Nas duas pontas mais embaixo, grande parte dos clérigos, bardos e outros personagens de suporte ou perícias sociais.

São nestas duas últimas pontas que quero divagar durante este texto.

RPG e o seu combate além da porradaria

Quando um personagem sem foco em batalha está no grupo, normalmente lhe é reservada a posição de curandeiro. Apesar de ser uma função importantíssima, eu não diria que é absolutamente necessária. Mesmo que esta pessoa muitas vezes se encarregue de ter habilidades para tornar aliados mais fortes — o famoso buff.

Se não há ninguém para curar o grupo, que invistam em poções de cura ou outras habilidades que os mantenham vivos. A chance de dar merda cedo ou tarde é grande, eu sei. Mas isso provavelmente vai acontecer porque o bárbaro ou a guerreira do grupo vão correr desenfreadamente para cima do inimigo querendo sangue. Mesmo que exista a possibilidade de desarmá-lo em vez de arrancar seu braço.

Claro que não estou dizendo para conversar com um ogro e pedir para que lhe abra caminho. Estou apenas sugerindo a pensar de maneira não usual.

Se você joga em um sistema onde existe magia, talvez nem mesmo metade delas cause dano. Muitas lhe dão a possibilidade de controle, permitindo modificar o cenário de alguma forma. Transformar terra em lama e então solidificá-la novamente para prender os inimigos no chão. Invocar uma ilusão para distraí-los enquanto os jogadores planejam se fogem ou tentam rendê-los. Em vez de bola de fogo, por que não usar uma magia de sono ou que faça o inimigo perder a vontade de lutar?

Sono parece efetivo contra moleques enxeridos (Scooby-Doo)

Na prática, bola de fogo e magia de sono teriam um resultado semelhante: os inimigos seriam postos para dormir. O combate seria resolvido. Porém, a beleza do RPG mora exatamente na forma com que os jogadores decidem resolver seus problemas e no que isso acarreta. Na decisão de usar sono, e não bola de fogo, e como o mestre conseguirá desenrolar o resultado a partir disso.

E o que fazer além de combate?

O mestre do RPG é a pessoa mais capaz de propiciar situações além do combate, pois é quem decidirá a maioria dos conflitos do jogo. E toda narrativa precisa de conflitos, correto? É compreensível como o combate, sendo uma forma tão prática e impactante de conflito, acaba sendo o principal recurso utilizado em uma campanha. Porém, ao pensarmos no cenário de uma campanha como um mundo próprio, as possibilidades que existem além do combate no RPG começam a ficar mais abrangentes.

Tramas políticas ou investigativas são exemplos de temas que não exigem combates constantes e costumam se encaixar em grande parte dos cenários de RPG. Aqui, inteligência e carisma não precisam ser apenas atributos do personagem, mas podem também ser instigados nos jogadores para que resolvam seus conflitos.

Além disso, um simples bêbado seguindo o grupo e enchendo o saco por um trago pode se revelar um encontro interessante. Quem sabe o homem se revele de grande conhecimento e um possível aliado? Porém, isso dependerá inteiramente da maneira como o grupo decidir interagir com ele e o quão astutos serão para entender quem o homem realmente é. Ignorá-lo por completo, dar uma moeda e ir embora ou recebê-lo aos murros também irão resolver a cena, mas definitivamente não da melhor forma.

O combate é insubstituível

Não me entendam mal. Eu sei que nada substitui um bom combate. Mas às vezes pode ser interessante sair do usual e jogar com um personagem que não seja um assassino inconsequente.

Ainda não tive a honra de jogar com um grupo onde todos os personagens não são combatentes, mas pretendo viver para isso. Estou ciente da probabilidade de um massacre assim que pisarmos fora da cidade, mas, como os jovens de alguns anos atrás diziam, YOLO.

Se quando o massacre acontecer, farei questão de vir aqui explicar porque não se deve jogar com um grupo composto apenas por não combatentes.

Overlays para streaming de RPG — Tormenta20 e Império de Jade

overlays para streaming de RPG

A pandemia de Covid-19 modificou a forma como as pessoas se relacionam e também mudou e muito o cenário de RPG de mesa no Brasil e no mundo. Com as medidas de distanciamento social, o número de mesas de RPG presenciais caiu e, consequentemente, o número de mesas online por plataformas como o Roll20 e o Foundry VTT aumentou e muito. 

Tanto é que, entre o primeiro trimestre de 2020 e o primeiro trimestre de 2021, Tormenta saiu da 28ª colocação como o sistema mais jogado em todo o mundo pelo Roll20 para o 15º lugar. Isso de acordo com dados divulgados pela própria empresa dona da plataforma. 

Os streams de RPG também aumentaram neste período. Apesar de já existirem desde antes da pandemia, como é o caso da Guilda do Macaco, o número de mesas online incentivou os jogadores e mestres a criarem seus próprios streaming, jogando ao vivo pelo YouTube ou pelo Twitch.

Muitas mesas de RPG transmitidas por stream já utilizam alguns modelos de organização de telas dentro da transmissão, os chamados overlays, para mostrar mestre, jogadores, mapas e rolagens. 

Para facilitar a vida dos streamers que não sabem como criar um overlay, ou mesmo para quem não quer ter trabalho e já utilizar um modelo pronto, apresento a vocês quatro modelos para transmissões de RPG utilizando os sistemas Tormenta20 e Império de Jade.

São dois modelos para Tormenta20 e dois para Império de Jade. Um para um mestre e quatro jogadores e um para um mestre e cinco jogadores, isso para cada sistema.

Overlays para streaming de RPG:  Tormenta20 e Império de Jade:

Os arquivos estão em formato PNG, com transparências nos espaços destinados às câmeras da pessoa que vai mestrar e das pessoas jogadoras. Também há um espaço para incluir a tela com o mapa de batalha (ou outras imagens) e ainda uma área para as rolagens. Abaixo de cada quadro destinado às câmeras, também há uma área livre para incluir o nome das personagens. 

A configuração de nomes e das câmeras pode ser feita pelo OBS ou por qualquer outro programa utilizado para transmissão dos jogos. Além disso, esses overlays também podem ser utilizados na edição de vídeos já gravados de mesas de RPG que não foram ao ar ao vivo. 

E aí, o que vocês acharam? Conta pra gente aí nos comentários. Avisa também, nos comentários ou marcando a gente nas redes, quando usar as overlays na sua stream!

Balbúrdia Narrativa — Campanhas longas de RPG: O que é preciso lembrar

Em meio à pandemia que chegou no último ano, sem faculdade e sem emprego, eu me afoguei em campanhas longas de RPG por meses a fio. Me comprometi a narrar mais de meia dúzia de mesas com frequência praticamente semanal, e até que lidei bem com os compromissos durante um ano. Porém, eis que a bela poesia caótica do universo decidiu me dar um estágio que me tomou todo o tempo que tinha e um pouquinho a mais. Resultado: meses sem narrar.

Ainda me acostumando com a rotina de um trabalhador desesperado, resolvi que estava na hora de retomar as mesas devagar, uma a uma. Mas depois de tanto tempo parado, o que exatamente eu precisaria trabalhar e o que seria bom de me lembrar — e lembrar aos jogadores — para fazer com que campanhas longas de RPG fossem retomadas com naturalidade?

Antes de mais nada…

Quero deixar claro que estes tópicos são relevantes ao decorrer de qualquer mesa de jogo, e não apenas no término de um hiato ou coisa do tipo. Qualquer campanha de RPG longa o suficiente precisa refrescar a memória do mestre e jogadores sobre determinados assuntos. Caso contrário, objetivos acabam sendo esquecidos, a imersão pode se tornar mais rasa e aquela história e personagens acabam sendo acidentalmente jogados ao descaso — erro que já cometi inúmeras vezes como mestre.

Quem são os protagonistas da campanha?

Todos ainda devem se lembrar dos nomes dos personagens e têm quase certeza que o bárbaro é um humano, e não um anão com gigantismo. Para se certificar, revisem suas fichas em conjunto. Este exercício é tão importante para o mestre quanto para os jogadores, afinal, você raramente vai enfrentar qualquer situação sozinho, então ter noção das habilidades e modificadores de seus companheiros não apenas acrescenta para o potencial do grupo, mas também cria um tipo de sinergia mecânica forte entre os personagens — em outras palavras, você comba com o amiguinho.

Revivendo a trajetória em campanhas longas de RPG

Muito bem, fichas revisadas. Dados em mãos, fichas na mesa, latão aberto e o jogo começa.

Agora, mestre, relembre aventuras passadas. Desafios que o grupo enfrentou unido e saiu vitorioso — ou foram derrotados. Recorde os momentos que fizeram com que estivessem onde estão. Adicione referências sutis à narrativa, instigue os jogadores com elementos que irão chamar seu interesse e farão com que se lembrem das situações. E assim, pincelada por pincelada, a imersão vai se revitalizando.

Um devoto de um deus rival pregando na praça da cidade deve chamar a atenção do clérigo e relembrar o grupo sobre os valores de seu companheiro. Um latoeiro vendendo um escudo pesado de segunda mão pode fazê-los pensar na morte trágica do guerreiro que os acompanhava. Uma pessoa da mesma raça do vilão da campanha adentrar a taberna vazia pode fazer com que sintam a urgência de seus objetivos. O que me leva ao próximo ponto…

Em campanhas longas de RPG, o que mantém o grupo unido?

Um grupo não costuma funcionar muito bem a não ser que tenham alguma coisa que os prendam uns aos outros. Companheiros de longa data podem depender de mera empatia, mas se estão juntos há tanto tempo, provavelmente foi porque em algum momento já tiveram um objetivo em comum.

Quais são eles? — no plural, sempre. Não estou falando apenas do objetivo principal da história, o vilão a ser derrotado, o plano a ser impedido, etc., mas sim de cada busca pessoal dos personagens envolvidos nela. Reavivar estes propósitos individuais insere o personagem — e jogador — novamente naquele mundo ao mesmo tempo que fortalece o vínculo entre o grupo.

O mundo do qual pertence o personagem

Por fim, a necessidade de trabalhar a ambientação da campanha mais uma vez. Como já aprofundado em um texto passado, é sempre bom manter em mente que os personagens fazem parte de um mundo muito maior, e certamente são influenciados por ele muito mais do que o oposto. Como todos estão sujeitos aos seus eventos, tocar em fatos relevantes e grandes acontecimentos recentes que podem impactá-los pode ser importantíssimo.

Conflitos políticos e militares, como a opressão de um estado por um governante pouco diplomático. Eventos históricos como guerras, assassinatos reais ou um vulcão que dizimou o país vizinho — e suas conspirações sobre ter sido uma catástrofe controlada. Dependendo do cenário de RPG que esteja jogando, tramas grandiosas e divinas, como a recente queda do maior dos deuses dentro de seu próprio império, provavelmente é algo que vale a pena ser comentado.

Resumiiiindo

Definitivamente existem diversos outros tópicos a serem considerados, e eles dependem muito da campanha, do mestre e dos jogadores. A imersão desejada, a profundidade de cada parte do sistema e do cenário, e por aí vai. Mas garanto que estes pontos aqui apresentados formam uma boa “cama de gato” para sustentar as sessões.

Não é difícil de esquecer o que aconteceu há meia dúzia de sessões, quem dirá há meses, um ano, dois ou mais. Às vezes tudo pode parecer mais claro na cabeça do mestre, mas não costuma ser bem assim quando se está jogando, e por isso, estas “pinceladas” aqui e ali sempre ajudam a manter o vigor de longas campanhas de RPG.

Quais outros aspectos você acredita serem importantes para a campanha e devem ocasionalmente ser relembrados? Deixa pra gente aqui nos comentários!

Personagens de Horror — Arquétipos de personagens para sua mesa de RPG

arquétipos de personagens

Peço desculpas a quem me acompanha, mas mês passado foi mais corrido que o esperado e ficamos sem texto. Seguindo nossa trilha de sangue e ossos descarnados rumo a aventuras arrepiantes, esse mês trago algo um pouco diferente dos anteriores. Vamos abordar uma parte fundamental para uma boa experiência de jogo: os jogadores criarem bons personagens. Passamos por diversas dicas para os mestres usarem os subgêneros do terror, mas ainda não passamos pelos personagens. Hoje vou intrododuzir os principais arquétipos de personagens de RPG de horror.

Tipos de personagens mais usados

Bons personagens podem tornar qualquer história inesquecível. Toda a responsabilidade de criar uma história marcante não deve ficar apenas a cargo do mestre de jogo. Uma boa sessão de RPG é uma criação e esforço coletivo. Cabe aos jogadores fazerem o seu melhor para criar e interpretar personagens que além de divertidos, se encaixem na proposta do jogo discutida na sessão zero.

É muito frustrante e complicado de conciliar personagens que destoem muito da proposta da mesa. Pode ser bem difícil entrar no clima de horror certo em um jogo de terror se um dos personagens for um Pistoleiro que atira confete com galinhas de borracha. Então, não é nenhum esforço criar algo dentro da temática proposta. Se você não gosta da temática, talvez seja uma boa ideia dispensar esse jogo em particular, deixe para a próxima.

Ao jogar RPG, a menos que a ideia do seu grupo seja MUITO incomum, escolhemos interpretar personagens heroicos. Pessoas que desejam melhorar o mundo de alguma forma: para si, para seus amigos e familiares,ou mesmo para o mundo inteiro. O primeiro passo é identificar qual o nível de idealismo heróico você deseja jogar.

Partindo da ideia que o jogo terá uma temática de horror, é possível se inspirar fortemente na literatura gótica, que notadamente desenvolve três tipos de personagens: Herói Inocente, Herói Trágico e Herói Decadente.

Herói Inocente

O herói desse tipo é alguém com qualidades mais próximas do ideal. O homem santo que busca a salvação para todos, a nobre que espalha a bondade, são personagens mais próximos do ideal de heroísmo clássico.

Muitas vezes esse tipo de personagem é associado com paladinos e clérigos de deuses bondosos e justos. Como estamos falando de personagens para jogos de horror, é uma boa ideia escolher algum defeito de personalidade que torne o personagem propenso a uma jornada de declínio. Ou alguma mácula que possa crescer aos poucos no âmago do personagem. Discuta com quem vai mestrar para criar algo que seja bom para todas as partes.

Como exemplos tempos Sypha Belnades de Castlevania e Gregor Vahn, personagem da Trilogia Clássica de Tormenta. Não vou dar spoilers, mas é um paladino de Thyatis que tem uma bênção-maldição que aos poucos o conduz a um caminho tortuoso. Como o Zemo disse em Guerra Civil,  ninguém é tão perfeito assim. 

Herói Trágico

Esse herói, como o nome já diz, é aquele marcado por uma experiência ruim no passado que fez com que mudasse para sempre. 

Como estamos falando de jogos de horror, pode ser interessante pensar em um evento sobrenatural: o irmão do personagem desapareceu na floresta assombrada, algum familiar foi atacado por um lobisomem, ele se tornou marcado pela Tormenta depois de um encontro bizarro com um ser estranho.

É necessário tomar cuidado com esse tipo de personagem para que a tragédia não o paralise. O que houve em seu passado (antes do jogo), definitivamente marcou sua trajetória de vida, mas não pode ser central no momento ou não haverá jogo. É muito chato se toda a narrativa girar em torno de apenas um personagem, então, tome cuidado para não tentar monopolizar a atenção da mesa inteira.

Bons exemplos desse tipo de personagem são Louis de Entrevista com o Vampiro, com seu amor pela humanidade, Naomi Nagata de The Expanse, que mesmo tendo algo de terrível no passado tenta compensar agindo corretamente e Alucard de Castlevânia, que precisa enfrentar o próprio pai pelo bem da humanidade.

Herói Decadente

Esse herói é alguém que já foi inocente ou trágico, mas caiu em desgraça. É o anti-herói, alguém que trilha o caminho limite entre as sombras e a luz. Alguém obscuro cujo arquétipo faz muito sucesso em animes. 

Ele pode ter um pacto com forças malignas que tenta quebrar, ser alguém entregue aos vícios que graças a algum evento decidiu agir em prol do bem maior. Não importa qual seja a marca da decadência, mas é importante que seja superável. O personagem precisa sobrepujar as amarras e conseguir agir heroicamente e em conjunto, ou o jogo ficará prejudicado. 

Geralmente, um grande  dilema para quem opta por esse tipo de personagem é fazê-lo pender demais para o lado das sombras. Alguém que constantemente toma ações prejudiciais para o grupo em benefício próprio. Lembre-se de que o personagem continua sendo um herói lá no fundo, ele fará a coisa certa, ou não há sentido em integrar um grupo heróico, e sim de vilões.

Exemplos de personagens decadentes são Belmont do anime Castlevania e Allan Quarterman do quadrinho A Liga Extraordinária.

Sempre é bom lembrar que RPG é um jogo coletivo, precisa ser divertido para todos que o jogam. Se seu personagem atrapalha a diversão dos demais, paralisa o jogo, é bom revê-lo.

Na próxima coluna voltaremos com a análise de subgêneros de terror dentro de jogos.

Bons sustos!

Balbúrdia Narrativa — Conflitos de interesse: Toda narrativa precisa de problemas

conflitos de interesse

Eu não sou, nem de perto, um grande criador de histórias. Mas uma certeza que tenho nesta não tão vasta experiência como escritor e mestre de RPG é que não existe trama sem conflito. É importante deixar isso bem claro na cabeça, caro escritor e mestre de RPG, pois gerar estes conflitos é uma de suas grandes responsabilidades — mesmo que não seja exclusivamente sua. Mas calma lá! Isto não significa que uma batalha entre protagonistas e vilões precisa acontecer toda sessão de jogo, por mais que muitas vezes satisfaça esta necessidade.

Conflitos são obstáculos, são empecilhos, são acontecimentos ou até mesmo personagens que se opõem aos protagonistas de alguma maneira e atrapalham e/ou tentam impedi-los de cumprirem seus objetivos. O combate é a forma mais comum de conflito em um RPG, é claro, e acredito que seja um ótimo exemplo para começar esse texto.

Por que existe conflitos de interesse entre herói e vilão?

Provavelmente porque o vilão é maligno. Parece um pouco óbvio, mas o ponto é exatamente esse. Dê um passo para trás, analise a situação como um todo e observe que um típico conflito de interesse entre o bem e o mal é, na verdade, um conflito que envolve a moralidade dos envolvidos. E, por mais que estejamos acostumados a presenciar este clássico embate de heróis contra vilões, luz contra trevas, se nos mantivermos presos a este tipo de conflito, a trama pode cansar bem rápido…

Quando comecei a mestrar RPG, os conflitos que preparava eram normalmente grandiosos. Inclusive, até hoje narro uma campanha onde meu maior arrependimento foi fazer o vilão ter objetivos divinos enquanto o grupo ainda estava no nível 3.

Em campanhas recentes, isso nunca aconteceria assim tão cedo.

Com esta ideia de conflito moral em mente, uma coisa que gosto de fazer é tentar me basear na vida real. Eventos que vivenciamos ou ou notícias que lemos normalmente resultam em ótimas adaptações para uma história.

A arte imita a vida?

A cada semana, somos bombardeados por manchetes sobre o desmatamento da Amazônia e como isso pode resultar no declínio do ecossistema e extinção de espécies. Agora pense em druidas que vivem na mata e entram em conflito com imigrantes recém chegados que começaram a derrubar árvores para erguerem suas moradas. Mesmo que não envolva batalhas, ainda é um conflito, não entre bem e mal, mas sim um conflito moral.

Um pensamento ainda mais simples e que acho bem importante de se recordar é que personagens, por mais abstratos que possam ser, ainda são baseados em seres humanos. Isto significa que possuem interesses, crenças, vontades e individualidades, e qualquer um destes pontos que se contrapõem entre dois personagens pode gerar um conflito.

Seu vizinho gosta de escutar som alto. Você, não. Eis um conflito de interesse.

Criar conflitos de interesse não é responsabilidade exclusiva do mestre!

Como mestre, gostaria de pedir uma coisa a todos os jogadores que pretendem jogar uma campanha que não seja muito curta: não resolva todos os conflitos do passado do seu personagem ainda no background (aos leigos, background é toda a sua história anterior ao início da campanha). Não precisa ser nada grandioso como uma vingança pessoal ou a intenção de se tornar uma divindade. Um objetivo íntimo e particular, como um parente perdido, já pode ser o suficiente. Talvez algo ainda mais simples, como catalogar plantas ou animais. Estas pontas soltas fazem com que o mestre tenha mais material para trabalhar, e cada uma delas pode evoluir para um novo conflito.

Independente da forma com que apareça, conflitos morais e de interesse costumam ser, mesmo que não percebamos, o ponto central de inúmeras tramas que lemos, jogamos e assistimos.

Lembra-se de algum conflito de explodir a cabeça que presenciou em alguma obra ou mesa de RPG? Compartilha com a gente aqui nos comentários!

Balbúrdia Narrativa — Trabalhando conflito no RPG: Dicas de Convivência para Jogadores Empolgados

conflito no RPG

Depois de ter publicado meu último texto, onde comentei um pouco sobre os desprazeres que um jogador entusiasmado demais pode trazer para um grupo, fui lembrado por um amigo sobre um tipo de babaca que acabei por me esquecer: aquele que desenvolve seu personagem inteiro com o objetivo de criar conflito na mesa.

Porém, não entenda mal. Este tipo de jogador nem sempre precisa ser um babaca. Na verdade, divergências entre os personagens é uma maneira excelente de causar conflito no RPG para desenvolver a narrativa de uma campanha. Apenas tome cuidado para que eles não se tornem maiores do que os objetivos que o grupo tem em comum.

Tem gente que só quer tacar fogo no parquinho

A Ovelha Brilhosa do Grupo

Aqui vai uma curta reflexão sobre como Adelaide Ossos de Farinha, uma sacerdotisa da vida e da cura que jogo nas mesas do Léo, viaja acompanhada de Rabicó Leite de Pedra, um bárbaro de colete e machado, e de Norbit Três-Dedos, um assassino goblinoide.

Primeiramente, Rabicó é filho de Adelaide. Por ter sido uma pessoa muito ocupada em missões sagradas ao longo da vida, Rabicó se criou longe da mãe pela maior parte do tempo, e nunca havia matado ninguém na frente dela até pouco tempo.

Aqui já temos um conflito interessante. Uma mãe ausente que vê o filho com valores morais tão diferentes dos seus e que agora se compromete a tentar fazê-lo enxergar os erros que comete. Ainda assim, Rabicó é um rapaz bem-criado, que escuta e respeita a vontade da mãe. E por mais que o filho seja apegado ao machado como ferramenta, Adelaide encara o desafio de fazê-lo entender que seus punhos podem ser uma arma tão poderosa quanto (e bárbaro lutador dá um combo BEM interessante, também).

Goblin: a chave para causar conflito no RPG

Porém, com Norbit a situação é um pouco mais delicada. O goblinoide é um mistério. Talvez tenha sido um escravo no caído Império Táurico, ou simplesmente um sobrevivente que cresceu na selvageria de Arton-sul. Três-Dedos é o famoso tipo que atira primeiro e pergunta depois. Por vezes zomba dos conselhos de Adelaide e acredita ferrenhamente que sua empatia é uma fraqueza.

Levou algum tempo até que Adelaide começasse a entender que esta era a única maneira que Norbit havia aprendido a resolver seus problemas. Sempre com adagas e mordidas frente a qualquer situação, é como se fosse um animal silvestre forçado a viver em sociedade.

O grupo funciona

Toda vez que entramos em combate, eu, como Adelaide, sempre tento proteger a todos, usando magias de encantamento até mesmo em meus próprios aliados para que eles não sejam capazes de tirar a vida de seus adversários. No início, tentava impedir que usassem suas armas, quase permitindo que criminosos fugissem impunes por isso. Porém, em determinado momento, surgiu-me o pensamento: será que eu não estou sendo um babaca por mudar as ações e decisões dos demais jogadores por este conflito?

Bem, até o momento eu acredito que não, por que o grupo funciona e as situações ainda se resolvem de outra maneira. Quando a magia de Adelaide não permite arrancar a cabeça de uma aranha gigante, eles encontram uma forma de derrubá-la pata a pata. Se conversar com Norbit não é o suficiente para fazê-lo entender que não se deve matar os outros apenas pela facilidade do trabalho, Adelaide talvez tenha que aprender a ter a humildade de um goblinoide para ganhar sua confiança.

Essa liberdade para colocar conflito na mesa não vem do nada. É uma mesa com amigos que se conhecem, que sabiam ainda na criação de fichas, quando foi determinado que os personagens seriam mãe e filho com visões de mundo opostas, que esse tipo de situação aconteceria. Mais que isso, é uma mesa jogada por pessoas com intimidade o suficiente para uma virar para a outra e falar “larga minha espada, seu babaca.” O conflito no RPG é possível porque não há conflito quanto a isso fora do RPG.

Conflito no RPG e o Caminho do Herói

Atualmente estamos dentro de Aslothia, uma nação tomada pela cultura necromântica, mas que, surpreendentemente, ainda abriga vida de uma maneira muito peculiar. Nosso objetivo atual é juntar informações sobre um barão, provavelmente um vampiro, e identifica-lo como uma ameaça real ou não.

Rabicó e Norbit possuem propósitos heroicos, mesmo que não queiram admitir. Além disso, Adelaide preza pela vida e condena a violência desnecessária. Cura os feridos e impede a morte de inocentes. Por mais que os ideais da clériga sejam o principal motivo dos conflitos do grupo, são valores que atribuímos a típicos personagens bondosos. Bons valores sempre costumam causar um bom conflito no RPG, também. Por mais que o conflito exista, ele vem de convicções factíveis dos personagens, e não de pura vontade de atazar todos os demais envolvidos.

Em outras palavras, o conflito vem das diferentes visões de mundo dos envolvidos do que seria “heroísmo”. Se este fosse um grupo de inocentes heróis e o personagem que causasse conflito fosse um necromante sanguinolento, este provavelmente não seria um bom grupo para se usar de exemplo neste texto, porque aí estaríamos lidando com um vilão, e a dinâmica seria completamente diferente.

Vocês já jogaram em uma mesa onde o conflito entre os personagens serviu para enriquecer a experiência? Conta pra gente nos comentários.

Bençãos da Deusa — Jogando Online: Guia para mestrar no Roll20, Parte 4

roll20

Depois do guia básico para mestrar no Roll20 — para ver os posts anteriores basta clicar em: parte 1, parte 2 e parte 3  — agora vem o Guia de Extras! Pequenas configurações e mapas e tokens que são úteis na mesa.

Começaremos pelos amados mapinhas!

Configuração de Mapas no Roll20

Ao clicar no quadro em azul indicado pela seta vermelha, você abrira a tela de mapas: todos os mapas daquela mesa aparecerão ali. Ao passar o cursor em cima do mapa, aparecerão opções, como indicado pela seta amarela. A roda dentada abre as configurações do mapa. Note que tem uma bandeira vermelha dizendo “players” em cima do mapa: indica qual mapa os jogadores estão vendo. Para movê-lo para outro mapa, basta arrastar esta bandeira vermelha.

Ignorem a aba de luz dinâmica, esta opção está disponível apenas nas versões Plus e Pró do Roll20. Na parte circulada em laranja, você vai aumenta ou diminuir o seu espaço de tela para o mapa. Mexa nos números da frente, os “25”. Na parte circulada em roxo, você mexe na cor do fundo.

A segunda imagem fica abaixo da primeira, rolando na lateral. É a partir daqui que a magia acontece. Na parte circulada em azul, você pode mudar a medida dos quadrado. Aqui no Brasil usamos metros, e não pés. Para jogos como Tormenta20, mude o número para ‘1,5’ e e a medida para “m” (metros). Bem abaixo, você tem a opção de ligar ou desligar a grade no mapa. Aqui, em vermelho, tem o pulo do gato: em Tormenta 20 por exemplo, andar na diagonal conta como “2 quadrados”. Para que a medida da régua fique correta, mude aqui para a opção “Manhattan”.

Mas atenção: Mude a opção em vermelho e só depois mude a medida, em azul. Mexer nesta caixa de distância faz a medida voltar ao original

A caixa em verde muda a cor das linhas do grid e o quanto elas aparecem. Quando mais para a esquerda, mas claro o grid fica. Quanto mais para a direita mais visível o grid fica. E para finalizar, claro, não esqueça de salvar, no botão rosa mostrado pela seta amarela: se fechar sem salvar, as configurações não são salvas.

Configuração de Tokens no Roll20

Ao abrir uma ficha, essas opções aparecerão. A opções em azul faz aparece na tela de todos os jogadores, se sobrepondo ao mapa. A opção em vermelho edita as configurações de token e da ficha (mas não a ficha em si: para isso, basta ir completando nesta página mesmo)

 

A opção em Vermelho muda o nome do personagem, a opção em azul é onde você marca quem pode ver aquela ficha no seu “Diário”, e a opção em verde determina quem pode editar e controlar aquela ficha.

Na caixa laranja, você pode designar um avatar, uma imagem para aquele personagem. E finalmente na caixa roxa, você designa o token do personagem. Para isso, o token escolhido precisa estar selecionado, como na imagem. Depois disso, é só clicar no botão “Use Selected Token”. Agora, veremos o que acontece quando clicamos na roda dentada que “salta” do token quando clicamos nele:

roll20

Aqui você também pode fazer as configurações de tokens com personagens. No retângulo vermelho, vai aparecer a lista de todos os personagens que têm uma ficha, e você pode selecionar qual deles este token representa. Abaixo, em azul, você pode selecionar qual jogador controla este token (incluindo a opção ‘todos os jogadores’). Em verdade, você coloca as barras no token, geralmente para representar vida, mana e outras coisas de acordo com a mesa.

No mesmo lugar onde vocês colocam as barras de vida, mana, etc, ao lado dos valores totais tem a opção “atributo” (nas setas verdes). Ali, você seleciona que parte da ficha aquela barrinha representa. No exemplo, eu selecionei “vida” e “mana”. Assim, quando os jogadores mexerem nos valores na própria ficha, automaticamente muda os valores nas barrinhas, e assim é mais fácil de controlarem seus pontos e você pode deixar cópias dos tokens em vários mapas, sem se preocupar em ter que pegar o último por causa do controle deles. Existem Várias opções de link, mas “vida” (pra controlar os Pontos de Vida) e “mana” (pra controlar os Pontos de Mana) são os mais comuns de se usar.

 

roll20

Aqui, são mais algumas opções para usar durante o jogo. Clicando na ‘bolinha” ao lado da roda dentada, aparecem estar opções: são marcadores para colocar no token, marcar alguma condição, enfim, o que precisar. E a dica aqui é: se você selecionar alguma das bolinhas coloridas e clicar em um número do seu teclado em seguida, o número aparece em cima da bolinha. É ideal para marcar inimigos genéricos sem se perder, como o capanga 1, capanga 2, capanga…..

Finalizando

Antes de encerrarmos, vou deixar pra você um site facinho e maravilhoso para fazer tokens, o Token Stamp 2. É fácil, rápido e tem várias opções de cores e modelos.

E este é o final do nosso Guia para Mestrar no Roll20. Espero que tenham gostam e ajude vocês a encherem a internet com mais RPG. Sei que não tratei de tudo, mas o objetivo era ser um guia básico mesmo. Lembrando que você encontra também temos a parte 1, parte 2 e parte 3!

Até a próxima e bora jogar RPG online!

Balbúrdia Narrativa — Não Seja um Babaca: Dicas de convivência no RPG para jogadores empolgados

convivência no RPG

Não é tão difícil de entender isso, eu sei, e também sei que você sabe. Porém, ao tratar do nosso bom e velho RPG de mesa, alguns jogadores tendem a ser tomados pela síndrome do protagonismo ou a abusar da desculpa de estar agindo sob a perspectiva do personagem, e tomar a liberdade de serem babacas. No meu último texto aqui do blog, escrevi sobre a importância do manual de RPG para definir limites mecânicos na “brincadeira de imaginação” que é esse hobby. Agora, quero falar sobre convivência no RPG e alguns limites um pouco mais subjetivos.

O protagonismo no RPG é coletivo!

Se você não está jogando um livro-jogo, onde joga sozinho uma história pré-definida que cerca seu personagem, provavelmente estará acompanhado de pelo menos mais dois ou três jogadores. Isso significa que todos fazem parte dessa trama, e todos são responsáveis por leva-la adiante. Ainda assim, não é incomum encontrar grupos onde um ou dois personagens acabam tomando a frente em todas as situações e tentam resolver tudo sozinhos, resumindo os demais em uma simples ficha e rolagens de dados em momentos específicos. Eu acredito que uma das funções do mestre seja a de instigar estes personagens-jogadores deixados no escanteio. Trazer alguma figura de seu passado para interagir com ele ou ela ou desenvolver uma cena importante em um momento em que esteja sozinho são boas opções. Porém, é essencial que todos os jogadores entendam a importância do protagonismo coletivo a todo momento.

Ei, bárbaro cheirando a suor vestindo uma tanga manchada de sangue, com penalidade em inteligência e carisma! Por que você está conversando com esta baronesa de maneira tão formal e cordial enquanto o seu parceiro, cavaleiro com conhecimento em etiqueta e aristocracia, está contando formigas ali atrás? Ah, é por que a jogadora é tímida? Então incentive-a, boa convivência no RPG também é lembrar que vocês são um time!

As ações de seu personagem também são suas

Você e seu grupo terminaram a masmorra depois de várias sessões de preparação, derrotando o vilão da campanha de maneira excepcional. Portanto, decidem comemorar torrando os espólios na taverna mais sofisticada da capital. Comem e bebem feito reis, menestréis sobem ao palco para entoar baladas sobre vossos feitos. Eis que, no ápice caloroso da noite, um dos personagens decide que é uma ótima ideia abaixar as calças e se esfregar despido nas pessoas ao redor. Não, meu amigo, pelo amor e ódio de cada deidade que já foi adorada na história da humanidade, isso não é uma boa ideia.

Um (des)exemplo

Esse exemplo que dei é um exagero de uma situação que eu quase presenciei em uma mesa. O jogador percebeu o incômodo do mestre e demais jogadores e fechou o cinto antes de agir. Porém, aqui vai um outro exemplo que não é exagerado e foi vivido por mim:

Um tempinho atrás joguei em uma comunidade com uns vinte jogadores, como uma pequena guilda exclusiva a conhecidos e amigos dos organizadores. Em algumas missões, um dos meus colegas de grupo foi um bardo descomedido, o típico artista que queria aparecer demais, porém, sem um pingo de bom senso ou moderação. Ressaltava a musculatura e virilidade do guerreiro, o calor e intensidade da cura da clériga. Sempre com uma forte conotação sexual. Fazia piadas sobre a velocidade do ladino…

O jogador se defendia com o mesmo velho argumento de que não era ele quem estava agindo, e sim o seu personagem. Mas não se esqueçam, rapaziada, que quem controla seu personagem é você. O objetivo do RPG é se divertir, e se o seu personagem age de maneira a deixar qualquer outra pessoa na mesa desconfortável, quem está causando o desconforto é você. Ou seja, você está sendo o babaca.

Tem mais alguma dica sobre como não ser um babaca na mesa? Compartilha com a gente nos comentários.

Para mais bons exemplos de convivência no RPG, você pode acompanhar Fim dos Tempos toda quinta-feira, às 20 horas, no Twitch da Jambô Editora

Balbúrdia Narrativa — Manual de regras de RPG: Leia, mas não se apegue

Antes de mais nada, gostaria de ressaltar o óbvio, mas que muitas vezes é ignorado, principalmente por jogadores em início de carreira: ler o manual de regras do RPG que está jogando é importantíssimo. Mesmo que eu goste de pensar e apresentar o RPG como sendo uma forma de narrativa tão única e do caralho quanto filmes ou romances, ele é, além disso, um jogo, e assim como todo jogo, possui um sistema de regras que deve ser seguido.

Pessoas que desconhecem o RPG podem enxergá-lo como uma brincadeira de faz de conta, um teatro sem roteiro e sem público, ou algo do tipo. Mas a diferença está exatamente na liberdade que você, como personagem, possui dentro da história que participa. Em uma mesa de RPG, fazer o que bem entender não significa que você vai ser necessariamente bem sucedido naquilo. Se você está aqui neste site, lendo este texto, provavelmente sabe que o RPG consiste em inúmeros testes baseados em rolagens de dados que irão determinar o sucesso ou falha de uma ação. O objetivo do manual é explicar quais são as possibilidades desta ação e, talvez mais importante, quais são os seus limites.

Jogador x Manual

Não haveriam muitos desafios caso todo ataque desferido atingisse o inimigo e toda porta trancada fosse arrombada com um palito de dentes. Limites e possibilidades, sucessos e falhas. Isso concede ao RPG uma camada de realidade, permitindo existir a chance do protagonista acabar morto por ter falhado em um teste de Diplomacia contra o rei.

Aah, se a vida fosse brincadeira, não é, Ned?

O manual de regras existe para ajudar a manter os pés no chão enquanto a trama se desenvolve. Porém, caso o sistema seja usado de maneira muito pragmática, ele pode acabar restringindo a criatividade dos jogadores na hora de interagir com o cenário.

Quando estou mestrando, especialmente para pessoas menos experientes, não é raro vê-las se entreolhando em silêncio em meio a uma cena em que não parece existir uma solução muito evidente. A sensação é de que eles aguardam o jogo agir por si só. Em outras palavras, esperam que o caminho a ser seguido se revele ou que a próxima pista seja entregue.

Quebre as regras do manual, mas só depois de tê-las aprendido

O grupo está investigando alguns criminosos locais, e possuía alguns indícios de onde seria seu próximo assalto. Porém, entraram em conflito com os foras da lei, e acidentalmente mataram todos eles. Sem suspeitos para serem interrogados, o ladino tenta encontrar informações através de um teste da perícia Investigação, mas falha. Os jogadores leem o manual para revisar cada uma de suas proficiências, perícias e poderes, mas, segundo as regras escritas, não há mais nada que possam utilizar para encontrar uma nova pista.

Nesta situação, a criatividade deve ser muito bem-vinda. Soluções inesperadas para os problemas que se enfrentam em uma campanha de RPG costumam resultar em situações memoráveis.

Se algum membro do grupo é um mentiroso dissimulado, pode espalhar falsas notícias pela cidade sobre um próximo alvo fácil para os bandidos, e então emboscá-los. Caso outro membro seja um apostador de jogos de azar, por que não apostar por informações? Se o grupo estiver com algum dinheiro sobrando, poderiam buscar por algum conjurador poderoso que pudesse se comunicar com o espírito de um dos criminosos assassinados.

Ainda que nenhuma destas possibilidades esteja escrita no manual, o mestre sempre pode permitir que coisas aconteçam ou deixem de acontecer se assim ele acreditar que faça sentido.

Em cenas de tensão e combate, tais dicas podem ser ainda mais interessantes. Em algum momento de sua jornada, os jogadores provavelmente irão esbarrar em ameaças maiores do que eles, mortais se enfrentadas da maneira que estão acostumados. Se o cavaleiro maligno tem uma armadura intransponível, talvez bater de frente talvez não seja a melhor opção. Em vez disso, jogue a corda para seu companheiro e se preparem para derrubá-lo do penhasco!

Em resumo, leia o manual! Quatro, sete, vinte vezes! Ele é a forma que o jogo que você está jogando foi pensado e estruturado. Porém, não se apegue a ele. Use e abuse de sua criatividade, pois o pior que pode acontecer é você ouvir o mestre dizendo “não, você não pode resistir ao dano de um tiro com um teste de Vontade.

Bençãos da Deusa — Jogando Online: Guia para mestrar no Roll20, Parte 3

roll20

Conforme prometido, vamos para a parte 3 do nosso Guia para mestrar no Roll20! Hoje vamos falar desta linda barra vertical que fica no canto superior esquerdo da sua tela (em verde). Você pode ler a parte 1 aqui e a parte 2 aqui.

Seta

Esta seta abre duas opções: “Selecionar/Mover” (laranja) e “Mover visão” (verde). A maior parte do tempo você estará usando esta seta, e na opção “selecionar/mover”, pois é como você mexe objetos, tokens e outra coisas no mapa. A opção “Mover visão” é para mexer a tela em cima; raramente uso, pois acho mais fácil fazer isso clicando com o botão direito do mouse ao invés de ficar alternando as duas.

Camadas

Aqui que a magia começa. Existem 3 opções de camadas no Roll20 (em vermelho):

“Plano de Fundo” (verde): como diz o nome, é onde fica o fundo da tela, geralmente o mapa, grid ou imagem daquela cena. Para colocar um mapa, basta deixa a opção “Plano de Fundo” selecionada e arrastar de outra pasta para o Roll20. Ali, você faz os ajustes necessários de tamanho.

“Objetos e Tokens” (laranja): é a camada usada pelos jogadores, e você também vai usá-la a maior parte do tempo. É onde ficam os tokens dos jogadores, dos inimigos, NPCs, enfim, tudo que aparece para os jogadores está aqui. Esta é a única camada que eles podem enxergar.

“Camada do Mestre” (roxo): é onde o mestre deixa tudo que somente ele pode ver. Uma marcação, um inimigo escondido pronto para aparece, qualquer coisa que guie o mestre. Posteriormente mostrarei como passar algo da camada do mestre para a camada de Objetos e Tokens.

“Opacidade de sobreposição do MJ” (amarelo): é o quão nítidas ou opacas as coisas que estão na camada do mestre aparecem para você.

. .

Pincel

A ferramenta Pincel (vermelho) tem uma série de opções que não vou explicar uma a uma, uma vez que são autoexplicativas. Você pode desenhar no mapa, fazer formas geométricas, escrever e uma série de outras coisas. Infelizmente a opção “limpar desenhos” (verde, no final) apaga tudo que tiver sido desenhado no mapa.

Zoom

A Ferramenta zoom (vermelho), como o nome diz, aumenta ou diminui o zoom da tela. Usando a ferramenta pela barra vertical, você escolhe entre os valores fixos. Porém, há uma barra vertical à direita (preto) onde você controla, podendo obter porcentagens de zoom diferentes.

Régua

A ferramenta de Régua (vermelho) é muito usada principalmente durante combates. Serve para medir a distancia entre objetos, personagens, verificar se o ataque ‘pega”. As opções de encaixe (laranja) marcam a partir de que parte do quadrado a régua começa a medir: do centro, do canto ou sem encaixe (o que vale é onde você clicou). As opções de mostrar ou esconder (verde) no geral servem principalmente se o mestre quer medir algo sem que os jogadores vejam. A régua em si (roxo) mostra a distância em medidas e em quadrados. É possível mudar a unidade de medida, falarei disso depois.

Nuvem

A “nuvenzinha” (vermelho) serve para ocultar áreas para os jogadores não verem. No geral, é usado para exploração de lugares. Em “Ocultar áreas” (verde), você esconde as áreas que não quer que os jogadores vejam, assim como em “Revelar áreas” (azul) você mostra as áreas que quer para seus jogadores. Na segunda imagem (seta laranja) mostro como fica a visão da área ocultada (ao redor) e revelada (no centro) pela visão do mestre. Na terceira imagem (seta roxa) mostro a mesma cena, mas do ponto de vista dos jogadores ( token do Pikachu representa um jogador da mesa. Certamente será uma mesa eletrizante xD). Para Ocultar, bem como para Revelar uma área, basta clicar na opção e selecionar o espaço desejado.

roll20

Iniciativa

Este em vermelho é o botão da iniciativa. É a ordem de ações, geralmente em combates. Ao clicar nele, abrirá a caixinha verde. Ali é onde estarão o nome dos personagens e inimigos e suas iniciativas. Dependendo da ficha utilizada, os jogadores podem selecionar seu próprio token e fazer a rolagem pela ficha, e seus nomes e números vão automaticamente para a lista.

Clicando no botão com a engrenagem (rosa) você abre as configurações da Turn Order. A primeira opção é em qual ordem você quer que apareça: ordem decrescente ou crescente (numérica) e ordem A-Z ou Z-A (alfabética). No geral, usamos a ordem Decrescente (do maior número para o menor número).

A segunda opção (laranja) é para adicionar itens à Turn Order. Podem ser os inimigos ou algum jogador que rolou e esqueceu de clicar no seu token antes de rolar. Ali você escreve o nome e clica em “adicionar”. O valor você põe manualmente na própria Turn Order depois que o nome aparecer ali.

O último botão (amarelo) é onde você limpa a Turn Order para um novo combate, todos os nomes e valores são apagados

roll20

Dados

Ao clicar neste botão que tem um d20 (vermelho), você abre este rolador de dados. A primeira opção é a rolagem básica (em verde): você clica no dado que quer rolar e ele rola automaticamente. Na opção avançada (em azul) você pode escolher quantos dados, qual dado e pôr um modificador, tanto positivo quanto negativo. Em baixo ele mostra suas últimas rolagens (em laranja) e você pode clicar em “Re-Roll” para rolá-las novamente sem ter que digitar tudo de novo na parte avançada.

roll20

Por último, temos a interrogação; este é o ícone de ajuda do próprio Roll20, e desta forma não cabe explanar sobre aqui.

E aí? Conseguiram entender até agora? Com esta parte 3 vocês já pode começar a montar suas mesas no Roll20! Teremos ainda uma parte 4, onde falarei das configurações de mapas e tokens. Por fim, espero que estejam gostando e sigam acompanhando o Guia! Até lá!

Leia também a Parte 1, Parte 2 e os Extras!

Balbúrdia Narrativa — O universo além da mesa: um pouco sobre construção de mundo

construção de mundo

Eis que no ano de 2020 o caos e a desgraça reinava não apenas no planeta inteiro, mas também dentro da cabeça de cada pessoa que conseguiu se isolar para cumprir com o básico da sobrevivência humana. Comigo não foi diferente. Faculdade trancada, desempregado e contato social próximo a zero por ter voltado a morar na casa dos meus pais enquanto eles se retiravam para um sítio da família a 10km do sinal de celular mais próximo. Como refúgio pro desespero da insanidade mental, resolvi me afogar em RPG, chegando a participar de onze mesas frequentes, jogando quatro e mestrando sete. Um pouco de mais, talvez.

Porém, tendo que planejar tantas sessões em tão pouco tempo, em alguns momentos de devaneio me deparei com uma verdade bem óbvia quando se para pra pensar: toda história, seja uma campanha de RPG, um romance, filme ou qualquer outra narrativa, é apenas uma série de acontecimentos que aquele mundo ficcional permitiu que acontecesse dentro de suas regras e possibilidades. Vamos falar um pouco sobre construção de mundo.

Construção de mundo: Os mecanismos por trás de cada história

Claro que, ao escrever um livro cuja história seja ambientada em um cenário autoral, quem escreve determina quais são as leis que irão reger aquele universo, para que então a história possa fazer sentido ali dentro. As varinhas mágicas do mundo de Harry Potter, por exemplo, são um elemento fundamental na construção de mundo, pois uma das “leis” deste universo é os bruxos se utilizarem destes artefatos para facilitar a canalização de feitiços. Porém, se J.K. Rowling, na época em que ainda agia como uma pessoa sã, enquanto ainda desenhava o primeiro livro da saga, tivesse determinado que os bruxos não se equipavam de varinhas, mas sim de cajados mágicos, isto não seria apenas uma mudança estética na história de Harry e companhia, mas sim uma mudança impactante em todo o mundo da magia.

Transformar um objeto simples e pequeno, que poderia ser facilmente guardado em um bolso discreto do casaco, em um pedaço de madeira maior do que um aluno calouro definitivamente acarretaria em cenas e situações completamente diferentes das que já lemos e assistimos, desde o momento em que Harry é escolhido pelo cajado forjado com pena de fênix em uma loja do Beco Diagonal, até o momento em que o cajado dos cajados é retirado das mãos do velho e frio professor Dumbledore. O que quero dizer com tudo isso é que todas as histórias necessitam de elementos que façam parte daquele mundo para que possam funcionar.

RPG também é uma forma de contar história

Agora, transportando esta ideia para dentro de uma campanha de RPG, lugar onde a narrativa é desenvolvida coletivamente com os seus protagonistas, quando o narrador conhece bem o suficiente os elementos do cenário, não necessariamente do mundo todo, mas apenas da região em que estão os personagens, o desenrolar da trama – e do improviso – se torna muito mais natural. Claro que o mestre não precisa saber quem foi o bisavô materno do padeiro da vila, mas o fato de existir um padeiro na vila já é um elemento que pode ser desenvolvido dentro do jogo.

Os elementos que gosto de definir na construção de mundo são a geografia, cultura, economia, costumes, religião e política da região em que os personagens irão se aventurar. E isso não é tão complicado assim.

Vou pular direto para um exemplo tirado de uma mesa que narrei no sistema Tormenta 20, ambientada em Arton.

O grupo havia partido da nação de Deheon e estava viajando a cavalo rumo ao reino de Fortuna para se encontrar com um aristocrata que havia lhes enviado uma proposta de trabalho, viagem esta que levaria pouco mais de três semanas. Eu sabia que a sessão — ou sessões — em que os jogadores passariam na estrada não teria um impacto considerável na campanha como um todo, sem grandes conflitos com vilões ou viradas de trama — a não ser que uma sequência inglória de erros críticos tirasse a vida de alguém —, mas não estava muito inclinado a resumir uma jornada de quase um mês a eventos aleatórios, rolagens banais ou simplesmente com “passou um mês e vocês chegaram”.

Conhecendo o mundo da sua mesa de RPG

Ao término da sessão anterior, o grupo havia decidido viajar pelo interior do continente, região mais rochosa e fria devido à proximidade com as nevadas Montanhas Uivantes, de terreno acidentado e árduo (geografia). Por ser uma terra desolada e com pouca diversidade de fauna e flora, decidi que o ofício mais comum dos moradores locais seria a extração de minérios em pedreiras e em minas de ferro (cultura), tornando a exportação destes materiais o principal comércio dali (economia). Por viverem em uma área tão desolada, afastada das principais rotas de viagem, normalmente os moradores não enxergavam estrangeiros com bons olhos (costumes).

As crenças na região eram variadas, mas pouquíssimas das civilizações erguiam altares. A maior exceção era uma cidadezinha habitada principalmente por humanos e anões, chamada Rocha de Grís, que possuía uma humilde igreja de Allihanna (religião). Por fim, a alta-sacerdotisa de Rocha de Grís fazia questão de lembrar a todos que a pedra e o metal também eram frutos da terra, e que a prospecção excessiva destes frutos poderia trazer consequências severas, ao mesmo tempo em que o líder da guilda dos comerciantes da cidade estava tensionando seu relacionamento com a igreja, pois as palavras da clériga deixavam os mineradores receosos e atrapalhava seus negócios (política).

A primeira parte da construção de mundo está pronta. Isto era tudo o que eu havia preparado e, com isto estabelecido, tornou-se prático desenvolver o restante da sessão a partir da curiosidade e ações dos jogadores.

Que entrem os jogadores!

Depois de passarem por testes de Sobrevivência e Cavalgar para se guiarem através de colinas pedregosas e fugirem de uma avalanche ao terem falhado nestes testes, chegaram a Rocha de Grís em um fim de tarde nebuloso. Percebendo olhares desconfiados em todo canto, a feiticeira sugeriu reabastecer os mantimentos e partir em seguida para que não causassem problemas, mas eu não queria que isso acontecesse, pois chegariam rápido demais ao objetivo final da viagem. Então, fiz um jovem pupilo de Allihanna e um minerador discutirem ferrenhamente diante das vistas do grupo, discussão essa que terminou com o nariz quebrado do minerador e a fuga do rapaz. Havia um druida de Allihanna entre os membros do grupo, e eu sabia que este conflito despertaria seu interesse. Prontamente os demais integrantes foram convencidos de que precisavam entender melhor o que estava acontecendo.

Encontraram-se tanto com a alta-sacerdotisa quanto com o líder da guilda, conversaram com alguns trabalhadores das minas e comerciantes. Descobriram que o jovem que havia quebrado o nariz do minerador era um recém-órfão temperamental e que, ao ser interrogado, inventei que ele havia agido daquela maneira pois tinha sido acusando de ter sabotado um carregamento de minério de ferro, trabalho que ele afirmava ter sido feito por demônios da ferrugem que amaldiçoavam o ferro em nome de Allihanna. Decidiram examinar o carregamento e encontraram o metal completamente apodrecido.

A construção de mundo no RPG é coletiva

O ladino sugeriu que a culpa poderia ser da sacerdotisa. Eu não havia pensado nisso, mas achei uma ótima ideia. A partir daquele momento, ela se tornou a culpada. Agora, quem decidiu inspecionar o carregamento foi a feiticeira, que rapidamente detectou rastros de magia na ferrugem. Interrogaram a clériga, mas não conseguiram prova alguma. Porém, durante a madrugada, o ladino desconfiado invadiu os seus aposentos e, com um lindo crítico em Investigação, encontrou as ferramentas para conjurar um milagre de transmutação que permitia alterar as características de qualquer metal, inclusive oxidá-lo até tornar-se pó.

Com as provas em mãos, viram-se diante de um dilema: acreditavam que a alta-sacerdotisa não era maligna, apenas via-se em posição de proteger aquela terra da influência pesada da civilização, e não seria facilmente coagida a abandonar este plano, ao mesmo tempo que sabiam que expô-la aos cidadãos e ao líder da guilda significaria seu exílio, prisão ou morte.

Depois de uns quinze minutos discutindo as possibilidades, decidiram entregar as provas para a própria sacerdotisa, alertá-la sobre os riscos que ela e seus pupilos corriam por seus atos imprudentes e deram as costas para a cidade. O grupo acabou percebendo que a trama de Rocha de Grís não era uma questão de bem e mau, certo e errado, e seria impossível resolver esta situação de maneira simples, ainda mais levando em consideração que haviam um compromisso importante dentro de poucos dias em um reino vizinho e que ninguém que habitava aquelas ruas de pedra cinzenta confiava minimamente em forasteiros.

O mundo ganha vida própria

A sessão terminou com os personagens se sentindo impotentes por não terem conseguido ajudar pessoas necessitadas, e com os jogadores reflexivos por compreenderem que nem todo problema se soluciona com aço e magia.

No início daquela sessão, tudo o que eu sabia era a geografia, cultura, economia, costumes, religião e política da região de Rocha de Grís. No final, tínhamos uma cidade muito interessante que o grupo ainda cogita retornar alguns níveis mais tarde para tentar, mais uma vez, prestar seus serviços à comunidade.

É muitíssimo importante ressaltar uma coisa que eu acredito ser essencial em qualquer mesa de RPG, mas obrigatória para que Rocha de Grís pudesse ter se desenvolvido desta forma em uma única sessão: a imersão dos jogadores dentro da narrativa e a vontade de, através da perspectiva dos seus personagens, explorar aquele universo. O RPG é, como disse anteriormente, uma narrativa formada coletivamente, e não apenas entregue pronta pelas mãos do mestre. Não é diferente com a construção de mundo, e o desenvolvimento de Rocha de Grís só aconteceu por que os jogadores tiveram curiosidade.

Para encerrar, é sempre bom considerar a possibilidade do grupo ter visto a briga entre o jovem e o minerador, respirado fundo e falado: “Dane-se, vamos ignorar tudo isso e continuar cavalgando em linha reta até o nosso objetivo”, e então metade do meu planejamento teria sido jogado para a patente sem descarga. Bem, caso isso tivesse acontecido, gostaria de lembrar que o Capítulo 7 do manual do Tormenta20 apresenta uma gama bem interessante de criaturas que poderiam dar cabo do grupo inteiro. E não seria um grande infortúnio se por acaso cada monstro aparecesse com dois ou três níveis a mais…