Sessão Zero: Como incluir os jogadores na criação da campanha de RPG

Sessão Zero: Como incluir os jogadores na criação da campanha de RPG

Sessão Zero: Como incluir os jogadores na criação da campanha de RPG

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É o dia do jogo. Você passou horas pensando e preparando a aventura, criou um mundo fantástico que mal pode esperar para mostrar aos jogadores, tem PNJs que tem certeza que todos vão amar e odiar e, o mais importante: está empolgado para narrar.

Um pouco depois que o jogo começa, entretanto, as coisas não vão bem como você esperava.

Os jogadores parecem desinteressados. Alguns mexem no celular, outros conversam sobre outros assuntos durante o jogo e, no geral, não dão muita atenção para a narrativa. Você tinha certeza que todos iriam amar o seu material, mas agora parecem entediados.

O que fazer para manter a atenção dos jogadores? Se você já narrou algumas vezes, talvez tenha passado por uma situação similar.

Há muitos fatores que podem levar a isso, porém se essa dispersão se tornar um problema, é sinal de que talvez você precise realizar uma sessão zero.

A sessão zero do RPG

A sessão zero é o encontro em que o narrador apresenta a proposta da campanha ou aventura e os jogadores criam os personagens.

Essa é uma ótima oportunidade para descobrir no que os jogadores estão interessados. Por isso, discuta o que cada um espera do jogo, que tipo de jogo desejam jogar e que tipo de história desejam criar. Apresente suas próprias ideias sobre o jogo e compare com o que foi dito. 

A sua empolgação com o jogo é tão importante quanto a dos seus jogadores, assim, em caso de divergências, o grupo deve negociar até que cheguem a um meio-termo. A medida em que a discussão avança, faça anotações listando os elementos de interesse individuais e coletivos dos jogadores – você as usará sempre que preparar aventuras e fizer decisões sobre o jogo.

Quando as expectativas sobre o jogo estiverem claras para todos, o grupo pode passar para a criação de personagens e construção de cenário colaborativa.

Construção de cenário colaborativa no RPG

Como narradores, nós gastamos bastante tempo e energia mental preparando e pensando nas aventuras, cenários e PNJs.

Logo, nosso investimento no jogo normalmente é maior, o que pode nos levar a ter apego a uma ideia de “como as coisas deveriam ser”. Dessa forma, deixar os jogadores definirem alguns elementos do cenário reforça a visão do jogo como algo coletivo, ajudando a evitar essa armadilha e abrindo espaço para que os próprios jogadores se tornem mais investidos no jogo.

Uma forma de tornar a criação do cenário mais colaborativa é através de perguntas.

Na sessão zero, você deve fazer várias delas para descobrir no que os jogadores estão interessados. As escolhas que os jogadores fazem durante a criação de personagens também dizem muito sobre seus interesses. Com base nisso, faça perguntas sobre elementos do mundo para os jogadores mais interessados nesses elementos.

Perguntas importantes

Por exemplo, pergunte ao ladino quais são as guildas de ladrões que existem na cidade. Pergunte ao elfo como são as festas de casamento do seu povo. Pergunte ao clérigo como são os templos do seu deus. Sempre que houver uma oportunidade na narrativa para preencher esses espaços, faça uma pergunta. 

O seu trabalho aqui é construir em cima das respostas, adaptando-as para para o tom da história. Não tenha medo das ideias que os jogadores podem trazer. Afinal, você ainda tem a palavra final sobre o que faz sentido para narrativa. O melhor é sempre tentar usar essas ideias de alguma forma.

Fazendo a história importar desde a sessão zero

Agora que o seu grupo tem um mundo que todos ajudaram a construir e com o qual todos se importam, você provavelmente está começando a pensar na campanha e na primeira aventura.

Você certamente pode ter uma história que deseja contar e vilões com planos terríveis para colocar em ação, mas tome cuidado para não deixar que esses planos passem por cima do que vocês já criaram juntos. A melhor campanha que você pode narrar para os seus jogadores é aquela em que apenas os personagens deles poderiam ter vivido.

Mais perguntas importantes

Para isso, novamente, faça perguntas. Pergunte aos jogadores sobre seus personagens: de onde eles vieram? Quem são as pessoas com que se importam? O que e quem eles odeiam? Com que pessoas e quais organizações eles têm contato? O personagem guerreiro veio de um vilarejo que foi atacado?

Pergunte ao jogador sobre os malfeitores. Foi algum grupo de bandidos ou uma horda de mortos-vivos? Como o personagem se sente? Será que busca vingança? O personagem mago era assistente de um necromante e então fugiu? Hmm… Será que esse necromante é responsável pela destruição da vila do guerreiro? Será que a vila era um teste para algo maior?

O melhor momento para isso é após a criação dos personagens, mas não tenha medo de perguntar durante o jogo também. Anote as respostas que conseguir e faça um mapa de relacionamento com esses itens. Assim, quando pensar sobre a campanha e criar aventuras, pense em como usar esses elementos para criar uma história única para os personagens.

Familiarizando os personagens

Em primeiro lugar, antes de criar cada aventura, pergunte por que os personagens se importam. Os jogadores vão tentar interpretar os personagens como se fossem pessoas reais, então ajude-os dando a eles motivos para seguirem o plot que você tem em mente.

Evite sempre oferecer ouro ou itens mágicos, torne as motivações para perseguir uma aventura pessoais. Sabe aqueles PNJs que seus jogadores criaram com quem os personagens podem contar? Coloque-os em perigo. Dê a entender, por exemplo, que o monge pode descobrir pistas do paradeiro do seu mestre nessa aventura.

Já existe um vilão que os jogadores odeiam e querem derrubar? Então, ofereça a possibilidade de obter informações sobre as suas fraquezas. Graças ao seu trabalho durante a sessão zero e todas as perguntas que seus jogadores têm respondido, você já tem todas as ferramentas que precisa para criar ganchos interessantes nesse ponto. Posteriormente, só é preciso de um pouco de criatividade.

E para encerrar…

E mesmo assim, você ainda pode ter sessões em que os jogadores parecem desinteressados.

Não é a sua responsabilidade, como narrador, manter o grupo engajado. Saiba reconhecer quando o grupo não está no clima para jogar e sugira ver um filme ou jogar um jogo de tabuleiro.

Entretanto, se você realizar uma sessão zero, deixar que os jogadores definam elementos do cenário, construir uma campanha a partir dos históricos dos personagens e dar motivações pessoais para que os personagens se importem com as aventuras, certamente terá um grupo de jogadores ansiosos para descobrir que vai acontecer em cada sessão.

14 COMENTÁRIOS

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Camila

“A melhor campanha que você pode narrar para os seus jogadores é aquela em que apenas os personagens deles poderiam ter vivido.”

É a segunda vez que eu leio essa frase e a segunda vez que me emociono. Achei muito foda. É isso. Perfeito.

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ALEXANDRE SANTOS

Eu criei uma apresentação resumida de Arton, história, política e geografia, para apresentar nas sessões Zero de T20. Acho que apresentar uma base do cenário é importante para jogadores novatos.

Adorei o artigo!

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    Matheus Gonzaga

    Certamente! Uma coisa legal depois de apresentar a base do cenário é perguntar aos jogadores quais foram os elementos do cenário que eles mais gostaram e quais foram o que eles não se interessaram muito. Isso vai te dar uma dica de como guiar o jogo. 🙂

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    joaopedrowm

    Bah que massa Alexandre, teria esse material disponpivel? Pergunto pois eu mesmo sou novo no mundo de Arton, ainda estou pra ler e pesquisar muita coisa, mas também já vou começar a mestrar, acho que esse material ia me ajudar, hehehehe.

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Igor Santos

Meu caro, você abriu os olhos de um mestre iniciante e ainda conseguiu detalhar muito bem tudo no artigo. Muito obrigado!!!

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Gustavo C. – Mestre de 10 sessões de T20

Essas premissas valem mesmo para cenários “prontos”. A contribuição dos jogadores na base da campanha facilita engajar os jogadores e facilita a vida do mestre, que não fica como único responsável por gerar as motivações das aventuras.

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    Matheus Gonzaga

    Facilita muito! É uma ótima forma de dividir o trabalho criativo e tornar o papel do mestre mais leve.

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Alan Nascimento

Conseguir prender a atenção dos jogadores durante toda a mesa é um desafio com dificuldade altíssima! Mas essas dicas sobre a sessão zero me abriram novas ideias. Eu costumo perguntar dos jogadores sobre a sessão, o que gostaram e o que não gostaram, mas a ideia de receber deles as expectativas pra campanha antes de iniciá-la é uma ótima sacada.

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    Matheus Gonzaga

    Espero que ajude, Alan! Lembra que também pode ser interessante realizar essa conversa durante campanhas mais longas, se os sinais de desinteresse começarem a aparecer. Bons jogos!

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Morrigan Ankh

Parabéns pelo texto! É acessível, ajuda a ter outro olhar na criação de proposta. Curti!

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    Matheus Gonzaga

    Obrigado, Morrigan. Que bom que tu gostou! 🙂

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Jones

Realmente. A sessão zero pode ajustar muita coisa,mas essa oportunidade parece passar despercebida para alguns narradores. Parabéns pelo texto!