Arrepios – Elevador

Arrepios – Elevador

Foto preto e branca, com dedo apertando botão de elevador

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Bem-vindos de volta ao nosso cantinho do terror.  O conto de hoje é sobre um trabalhador comum que se depara com um assassino em sua volta para casa. Em quem você pensaria se estivesse prestes a morrer? Bons arrepios!

Elevador

             Já era tarde quando estacionou seu carro no subsolo. Se preparava para o sermão que iria ouvir da esposa, por trabalhar demais e não dar atenção para a filha pequena do casal.

            Tinha um argumento que para ele era bem convincente: A vida que dava para as duas. Se ele não trabalhasse tanto, como ela estaria em uma boa escola, ou onde iriam morar?

            Ainda no carro, o alarme de seu smartphone tocou. Renata havia colocado alguns lembretes em seu celular, para que ele ligasse para a filha e conversasse com ela, ao menos por telefone. Foi cancelar o alarme, e pela quinta vez seguida apenas o adiou. Lembrou-se de como detestava tecnologia.

            O monitor preso na lateral do elevador, mostrou algumas propagandas, seguidas de normas do condomínio e dicas de boas práticas para manter uma vizinhança saudável. Notou agora que, apesar de quase uma década morando no mesmo lugar, não conhecia nenhum vizinho.

            Chegou em seu andar. O corredor, que separava o seu apartamento do apartamento ao lado era extenso e normalmente bem iluminado. A luz, que era acionada por movimentos, parecia falhar, fazendo com que a lâmpada piscasse com uma frequência irritante. Ouviu um som que lembrava um pedaço de bife sendo amaciado, seguido de um sussurro partindo do fundo do corredor.

            Não queria, mas precisava saber do que se tratava tais ruídos. Aos poucos seus olhos acostumaram-se a pouca luz, e o borrão escuro tomou  a forma de um homem, à primeira vista ajoelhado sobre algo.

            — Quantas vezes eu te falei? Não era pra terminar assim. — dizia a voz grave e meio rouca.

            Deu mais alguns passos a frente, acionando então o sensor do corredor. Desejou não ter realizado esse movimento.

            Um homem branco, cabelos curtos, nariz arrebitado e sangue escorrendo pelo rosto o olhou. Com o susto da cena, os dois permaneceram imóveis.

            A visão estarrecedora fez seu estômago embolar. O homem segurava a cabeça de uma moça loira com a mão direita, enquanto sua mão esquerda apertava uma faca apoiada no chão. A cor original do piso era indecifrável, devido ao mar vermelho que o cobria. As gotas de sangue espirradas na parede, a mão da moça, que parecia segurar em vão o peito do homem e a cor vívida do líquido lembravam um poster de filme de terror.

— Você não pode me julgar, as vozes na minha cabeça me contaram sobre os planos dela.

Guilherme continuou parado. Visto pelo lado de fora, parecia um ouvinte atento disposto a ajudar, porém por dentro, era um misto de terror e covardia.

            Decidiu voltar para o elevador. Em passos lentos, foi tomando distância sem que desse as costas à cena. Quando conseguiu um distanciamento que julgou suficiente, moveu-se em direção ao elevador, que fechava suas portas tranquilamente.

            O homem grande levantou-se e patinou duas vezes no sangue. Cada segundo era importante, e Guilherme sentiu-se péssimo por agradecer esse escorregão providencial.

            Colocou a mão para barrar a porta do elevador, apertando desesperadamente o botão do térreo. Viu o homem correndo em sua direção com a faca e a cabeça em mãos, e sentiu-se um rato preso dentro de uma ratoeira. A porta começou a se fechar.

            O homem, percebendo que não chegaria a tempo, arremessou a cabeça da moça loira, que bateu com um ruído seco no chão e foi rolando com dificuldade em direção a ele. Um fio de cabelo loiro ficou preso na porta após ela se fechar, e Guilherme fitou os olhos castanho claro da cabeça, reconhecendo a moça, com quem já se encontrara no elevador.

            O alívio de estar em segurança era terrivelmente desconfortável. A cabeça o olhava com um semblante de desespero, e ele lutava internamente para decidir se fechava os olhos da moça ou não, quando ouviu o som das portas do elevador no oitavo andar se abrindo.

            — Não escute ela, vai mentir pra você. Não sou um homem ruim. — disse a voz rouca poucos segundos antes da cabeça rolar, devido ao impacto do corpo do homem no teto do elevador.

            — Não a escute, é uma mentirosa. — repetia, enquanto pulava em cima do elevador. A voz abafada pelas paredes, tornava-se ainda mais aterrorizante.

            Subitamente, o elevador parou e todas as luzes apagaram-se. Procurou em seu bolso pelo celular, e a luz da lanterna fez os olhos da moça parecerem vivos. Olhou para cima e viu que o teto começava a ruir perante os golpes.

            O elevador parou entre o quinto e o quarto andar. Começou então a forçar a porta, que não ofereceu tanta resistência quanto ele pensou. Conseguiu abri-la, e observou-se em frente a uma parede cinza e bolorenta. Foi iluminando toda a parede, até perceber que existia um vão que dava para o quarto andar.

            Precisou abaixar-se, e sem intenção, repousou a perna no rosto da moça. Tentou não pensar muito na situação e focar em sua fuga, mas a calça molhada de sangue era um lembrete que sua vida estava em risco.

            Arrastou-se por entre o vão e a parede, caindo no chão segundos antes do elevador descer abruptamente. Levantou-se, e antes de correr para usar as escadas, sentiu um vento frio cortando sua orelha. Olhou para o lado e viu a faca ensanguentada saindo de um pequeno vão que surgiu após o elevador descer alguns metros. Admirou perplexo o rosto do homem o fitando, enquanto o braço balançava, tentando acerta-lo.

            Guilherme correu e abriu a porta da escadaria de emergência, a tempo de ouvir o elevador cair mais alguns andares.

            O som alto de metal e concreto se abraçando era como música, e o alívio foi afável como um abraço.

Estava no completo breu quando ouviu a porta da escada se abrir.

            — Eu sei que ainda está aqui. Cadê minha esposa? Você tentou fugir com ela. — dizia a voz rouca.

            Guilherme ficou em silêncio, subindo lentamente as escadas, torcendo para não ser escutado. Afinal, não tinha como o homem ter certeza que ele estava ali. Era só fazer silêncio, que tudo ficaria bem.

Os passos do homem começaram a soar longe, por sorte, ele achava que Guilherme havia descido.

            Enxugou o suor que surgia na testa, com o medo irreal do barulho de uma gota o denunciar. Seu corpo todo estremeceu quando ele sentiu o celular vibrar, anunciando o lembrete que dizia “Ligue para ela enquanto há tempo”.

Escrito por:

Waldir L. Santos

Considero-me um "Autor não-convencional", com livros publicados em diferentes gêneros literários, prefiro dar asas a minha imaginação a prende-la em uma barreira imaginaria que divide até onde escritor deve ir. Siga-me no Instagram (@Waldirlsantos) e conheça um pouco mais sobre meus livros de terror, suspense, zumbi, dramas e o que mais aparecer nesta cabeça confusa, mas decidida.

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