A Jornada da Mestra — Navegar é preciso, RPG não é preciso

A Jornada da Mestra — Navegar é preciso, RPG não é preciso

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RPG é sobre contar histórias. O mestre propõe uma situação, os jogadores a desenvolvem e isso se repete até o desfecho. E, é claro, essa proposta em algum momento vai descambar, afinal, lidamos com jogadores imprevisíveis.

Antes de começar a mestrar, esse era um dos meus medos: não saber conduzir a imprevisibilidade da narrativa. E se um jogador não quiser ajudar o taverneiro? E se o grupo desviar do caminho que eu preparei? O que eu faço quando uma situação acontece e isso não estava no meu planejamento?

Particularmente, eu não gosto de estar despreparada quando falo sobre algo. Em todos os seminários que participei, eu estudava até o último minuto sobre o assunto. Entretanto, mesmo com o preparo do Batman, imprevistos sempre ocorrem. É normal. E isso acontece bastante no RPG. Mesmo assim, eu ainda sentia receio do improviso.

Com preparo ou sem preparo?

A “batinização” também pode ser um risco. Perdi as contas de quantas vezes escrevi vários textões, mas não usei metade do planejado. E, mesmo assim, imprevistos sempre aconteceram. Seja porque eu esqueci de algo ou porque tomaram uma decisão inesperada.

Por exemplo:

O grupo encontrou uma lápide e nela havia uma inscrição um pouco apagada. Usei traços para simular as letras faltantes, mas uma frase ficou indecifrável porque eu não me lembrava do que havia escrito, nem havia salvo o trecho completo em outro lugar. O túmulo pertencia ao antepassado de um senhor, como ele sentia muito orgulho de sua linhagem familiar, aproveitei esse gancho e as perguntas dos jogadores para explicar mais sobre as lendas locais. Deu tudo certo e os jogadores saíram satisfeitos.

Num outro momento, o grupo investigaria um lugar o qual eu esqueci de aprofundar. Como eu não queria deixar ninguém de mãos abanando, utilizei pontos chaves que eu já havia escrito e alguns trechos da história maior para compor a cena. Sempre que os jogadores se interessavam por algo, eu tentava fazê-lo ser importante com base no que eu tinha, como um mecanismo que surgiu porque eles estavam muito curiosos com uma mesa.

O grupo outra vez encontrou uma serva de Tanna-Toh, orgulhosa de seu orfanato e casa de letramento. O encontro era sobre suas pesquisas, mas os jogadores resolveram transformá-lo num processo de adoção. Eu precisei tirar um monte de NPC do umbigo e não consegui revelar as informações que eu havia planejado.

Numa caverna, eles encontraram uma passagem bloqueada e acharam que tinha algo do outro lado. Spoiler: não tinha. Mas eles estavam tão empenhados em atravessar, até se arriscaram para isso, que procurei por uma carta importante que apareceria posteriormente e fingi que ela estava lá o tempo todo.

Deixa Nimb me levar, Nimb leva eu

Imprevistos acontecem e não há nada o que possamos fazer sobre isso. Entretanto, podemos lidar com eles da melhor maneira possível.

Improvisar não é tão difícil quanto eu havia imaginado, mas esse ainda é um dos meus maiores nêmesis. Tento sempre ter algo básico para me guiar, um plano maior e menos detalhado que pretendo seguir, um esqueleto que é preenchido continuamente. Ainda não precisei me virar nos 30, criando algo do absoluto nada, mas sei que essa hora pode chegar (e sei que não vou estar preparada, mas é sobre isso e está tudo bem).

Não importa se você tem um plano B, C ou D, uma hora o improviso vai te pegar. Não é nenhuma chuva da Tormenta, nem um bicho de sete cabeças, e podemos sempre contar com a ajuda dos jogadores, afinal, construímos a história em conjunto.

Ter pouco preparo é perigoso, assim como preparar muito pode ser frustrante caso você não consiga utilizar todo o planejado. Sigo tentando manter um equilíbrio e fazer amizade com o improviso.

Bebam água, joguem RPG comendo frutas e até a próxima!

2 COMENTÁRIOS

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William Pinto

Essa questão de improviso é divertida também, às vezes. Já estive numa mesa em que as coisas não eram planejadas; era tudo criado conforme o grupo jogava.

E apesar do caos, era engraçado lidar com as coisas que iam surgindo. Deu muitas situações inesperadas e piadas internas. Mas acho que funcionou porque ninguém estava levando muito a sério kkk

Apesar desse comentário, também prefiro algo mais minimamente organizado, principalmente se for pra durar várias sessões. Às vezes o volume de caos fica sufocante!

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Fernando O

Tenho alguma experiência narrando, mas não muita, e uma das partes que mais me divirto é quando preciso improvisar. Atualmente tento deixar pensado previamente o arco principal da narrativa. Para onde pretendo conduzir os jogadores e quais os eventos significativos que eles vão encontrar pelo caminho. Mas sempre deixo muito espaço para que eles possam contribuir e tomarem decisões significativas. Eventualmente há dois caminhos claros que eles podem seguir e tento estar preparado para ambos. Talvez o aspecto que penso ser mais difícil de improvisar é quando você precisar criar encontros de combate em sistemas pesadamente dependentes de regras, ainda mais jogado via VTT onde é preciso ter um mapa, tokens e fichas configuradas.